27 de Agosto - São José Calazans, Confessor

Esse traço mostra a têmpera de alma desse intrépido soldado de
Jesus Cristo, que de diferentes formas muito dano iria causar ao demônio, e que
por ele seria perseguido até o fim de sua longa vida.
Coube-lhe a glória de “haver aberto a primeira das escolas
gratuitas para meninos do povo”, e é graças a ele que “a religião pode dizer que
o ensinamento dos pobres lhe pertence por direito de nascença e de conquista”
(2).
Da Espanha para o centro da Cristandade
O jovem filho do Barão de Peralta, tendo estudado nas melhores
universidades, e falando perfeitamente a língua latina, doutorou-se em Direito
civil e eclesiástico. Um conceituado biógrafo do Santo observa que ele,
“escuta os teólogos, discute com agudeza os subtis problemas da metafísica,
faz versos, freqüenta o trato dos homens sábios e santos, e, aos 20 anos, tem
todo o prestígio dos grandes mestres. .... Alto, robusto, atlético, ombros
largos, organismo de aço, cabeleira loura abundante, José parecia chamado a
aumentar com bélicas façanhas os brasões de seus antepassados” (3).
Entretanto o brilhante estudante resolvera seguir a carreira eclesiástica.
Mas, falecendo-lhe o irmão mais velho, o pai quis forçá-lo a
casar-se para substituí-lo na baronia e assegurar a dinastia. José recomendou-se
à Rainha do Céu, de quem era devotíssimo. Foi atacado então por uma moléstia
mortal, que o levou à beira do sepulcro. Quando todos choravam à sua cabeceira,
perguntou ao pai se lhe seria permitido seguir sua vocação caso se curasse. O
Barão, que já via o filho defunto, em lágrimas concordou. Contra todas as
esperanças, José começou a recuperar-se tão rapidamente, que em pouco tempo
preparava-se para o sacerdócio. Assim recebeu a ordenação sacerdotal no ano de
1583.
Depois de trabalhar nas dioceses de Huesca, Albarracín e Urgel,
atendendo a uma voz interior, o herdeiro dos Calazans trasladou-se para Roma,
onde se tornou teólogo do Cardeal Colonna. Para satisfazer à sua extrema
caridade, entrou em várias arquiconfrarias pias para atendimento de presos,
doentes e crianças.
Congregação das Escolas Pias: obra providencial, de futuro,
traída
Ao passar pela área do Transtevere, bairro popular de Roma, em
suas obras de caridade, José sentia o coração opresso ao ver meninos
vagabundeando pelas ruas, sem instrução e expostos a todos os riscos e vícios.
Tentou obter para eles lugar nas escolas subvencionadas pelo Poder Público, mas
encontrou as maiores dificuldades. Concebeu então o plano de fundar uma escola
inteiramente gratuita para meninos, encontrando eco no pároco de Santa Dorotéia.
Este não só lhe ofereceu duas salas paroquiais, mas associou-se a ele na labuta.
Aos poucos o número de alunos foi crescendo e mais dois sacerdotes uniram-se aos já existentes. Tornou-se então necessário mudar para lugar mais amplo, sendo-lhes oferecido o Palácio Vestri, junto à igreja Santo Andrea della Valle. Com a vinda de mais auxiliares, tomou aí corpo a congregação dos Pobres da Mãe de Deus e das Escolas Pias, que o Papa Paulo V “quis que se chamasse Paulina, honrando-a com seu nome para dar a entender que era obra sua” (4).
Os novos religiosos ensinavam aos alunos as primeiras letras,
aritmética e gramática, instruindo-os ao mesmo tempo nos princípios religiosos e
bons costumes.
A princípio, a obra de São José de Calazans encontrou aplauso
universal e a proteção de Cardeais, Príncipes, nobres. Houve no início grande
número de candidatos dessa classe social, que foram modelos de perfeição. Mesmo
assim o Santo não podia atender a todos os pedidos de fundação por falta de
religiosos em número suficiente.
“Luta de Classes” interna: irmãos leigos X Clérigos

Contribuía muito para a popularidade dessa obra o fato de seu
fundador ser um taumaturgo a quem se atribuíam milagres estupendos, inclusive
ressurreições.
José de Calazans pedia constantemente a Deus a graça de morrer
pregado à Cruz, com Nosso Senhor Jesus Cristo. Essa Cruz lhe veio da parte de
quem menos podia esperar: dos seus próprios filhos! Imitou assim o Divino
Redentor não só na Crucifixão mas também como vítima da traição de novos
Judas.
Apesar de possuir todas as graças de fundador, a Providência
permitiu que São José, para atender às contínuas demandas, aceitasse em sua
Congregação, sem muita seleção, principalmente para irmãos leigos, pessoas que
depois ser-lhe-iam causa de muita tristeza. Pois, mais adiante, devido à
escassez de pessoal docente, começou a escolher os mais inteligentes desses
irmãos leigos para a docência.
Ora, assim promovidos e esquecendo-se de todo espírito religioso,
iniciaram eles uma revolução interna na Congregação. “No princípio, os alvoroços
tiveram um caráter que poderíamos chamar mais bem de democrático e social. Foi
uma luta de classes de [irmãos] leigos contra clérigos, de coadjutores contra
sacerdotes” (6). Os irmãos leigos promovidos quiseram primeiro obter o
privilégio de usar chapéu, como os professores sacerdotes. Foi-lhes concedido.
Exigiram então a tonsura, que a custo obtiveram. Aspiraram em seguida ao
sacerdócio. E, “resolvidos a conquistar a igualdade suspirada, começaram a
conjurar, a rebelar-se, a inquietar o instituto e a buscar os apoios de gente do
século” (7). A rebelião chegou mesmo à agressão física.
“Compreendendo que havia sido demasiado acessível na admissão do
pessoal, o fundador esforçava-se agora para selecioná-lo, animando os
dissidentes a passar para outras Ordens, e mostrando-se mais rigoroso com os
noviços. ‘Não temais ¾ escrevia a seus
lugares-tenente ¾ abrir 100 portas em
lugar de uma para que saiam todos os religiosos; e fechem noventa e nove e meia
para permitir a entrada aos que se apresentem’” (8).
Provincial ambicioso lidera a rebelião

Houve reação, principalmente da parte de vários Príncipes, tendo
o Pontífice Inocêncio X, que sucedeu a Urbano VIII encarregado “ uma
congregação de cardeais entendida nos assuntos das ordens religiosas [a
estudar a questão], os quais determinaram que o servo de Deus devia ser
reintegrado no generalato com seus quatro assistentes depostos. Não obstante ...
não só não teve efeito esta resolução senão que, exageradas por seus
fomentadores as turbações domésticas, e fomentadas ou não corrigidas pelo
segundo visitador, o Sumo Pontífice expediu, em 1646, um Breve reduzindo a
Congregação das Escolas Pias à congregação de sacerdotes regulares, como a de
São Felipe Néri” (10). Em outros termos, de religiosos com os três votos e
obediência ao superior da Congregação, passaram a ser sacerdotes seculares, sob
a dependência dos Ordinários locais...Era o fim da obra.
Revanche da Providência Divina:restauração da Congregação
post-mortem
O calvário de São José de Calazans chegara ao fim. Assistiu assim com
tranqüilidade a extinção da obra à qual dedicara meio século de sua existência,
vendo em todo o ocorrido somente a vontade de Deus.
Morreu aos 92 anos, alegre, teve a revelação ¾ que comunicou aos presentes junto ao seu
leito de morte ¾ de que sua obra
ressuscitaria. E assim foi, pois em 1656 sua querida Congregação foi restaurada.
A honra de Deus e de Seu fiel servidor foram desagravadas com a
beatificação de José de Calazans, em 1748, e posterior canonização, menos de 20
anos depois.
O que aconteceu com seus verdugos? É certo que já prestaram
sérias contas a Deus por seus atos, e que não deixaram traço de seus nomes para
a posteridade...
Fonte: Catolicismo
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