21 de Agosto - Santa Francisca Frémiot de Chantal, Viúva
Co-fundadora da Ordem da Visitação de
Nossa Senhora
No século XVI, a
heresia protestante devorara como um câncer quase toda a Alemanha. Lançando
metástases pela Europa, penetrou tão perigosamente na França, que em breve seu
poderio foi o de um Estado dentro do Estado.
Aproveitando-se da
fraqueza e omissão da dinastia francesa dos Valois, dirigida efetivamente pela
inescrupulosa Catarina de Medicis e do apoio de membros da mais alta nobreza,
seduzidos pela nova heresia, esta ameaçava a própria existência da única e
verdadeira religião, a Católica.
Diante do perigo, os
católicos, liderados pela família dos duques de Guise, formaram uma Liga Santa
para a defesa de sua Religião. Dissolvida por Henrique III, a referida Liga
renasceu em 1587, quando o Tratado de Beaulieu favoreceu demasiadamente os
huguenotes, como eram chamados os protestantes na França. Da Liga fazia parte o
enérgico e ardente católico Benigno Fremyot, Presidente do Parlamento da
Borgonha, casado com Margarida de Berbisey. Foi nesse ambiente, carregado das
guerras de religião, que nasceu Joana, segunda filha deste casal.
Não há dúvida de que
o amor materno é insubstituível na formação moral e religiosa da prole. O caso
do Presidente Fremyot foi uma das notáveis e raras exceções a essa regra. Joana
tinha apenas 18 meses quando faleceu a mãe, no parto do terceiro filho, André.
Benigno Fremyot supriu a falta da esposa dando aos filhos uma educação ao mesmo
tempo afetuosa e viril. Dos três que teve, a primeira faleceria piedosamente
poucos anos depois de casada; a segunda seria elevada à honra dos altares; e o
último, por sua virtude e qualidades morais, tornar-se-ia, aos 21 anos,
Arcebispo de Bourges e amicíssimo de São Francisco de Sales.
O Presidente Fremyot
os reunia de manhã e à noite para ensinar-lhes a rezar, conhecer e amar a
verdadeira Igreja e o Papa. Quando seus filhos foram crescendo, o Presidente
Fremyot contratou mestres escolhidos para reforçarem sua formação. "Joana
aprendia com grande facilidade e viveza de imaginação. E, dado seu bom talento e
a posição que ocupava no mundo, foi-lhe ensinado tudo o que deveria saber uma
jovem de sua classe: ler, escrever, dançar, tocar instrumentos de música, canto,
os labores próprios ao seu sexo etc."
Ao receber a
Confirmação, por devoção ao Poverello de Assis, Joana acrescentou ao seu o nome
de Francisca.
Aos 20 anos, Joana
Francisca foi dada pelo pai em casamento ao Barão de Chantal, valoroso oficial
do exército francês e católico, embora desde a morte da mãe ele levasse uma vida
um tanto dissipada.
O primeiro cuidado de
Joana foi conquistar o coração do marido para levá-lo inteiramente a Deus.
Isso não foi
difícil, pois o Barão, além das boas predisposições que possuía, percebeu logo
que Deus lhe tinha dado por esposa uma santa. A união entre eles foi tão grande
que se dizia que tinham um só coração. Ao mesmo tempo a baronesa estabeleceu,
com bondade e firmeza, a ordem e a disciplina no seio da numerosa criadagem do
castelo.
O casal foi abençoado
com seis filhos, dos quais os dois primeiros faleceram apenas nascidos.
Sucederam-lhes outro filho e três filhas, tendo a última nascido poucas semanas
antes da morte do Barão.
Mortalmente ferido
por seu melhor amigo num acidente de caça, recebeu os últimos Sacramentos,
perdoou seu homicida e recomendou à Baronesa que se resignasse à vontade de
Deus.
Joana ficava assim viúva aos 28 anos, com quatro filhos para educar e o baronato para dirigir. Foram-lhe necessárias toda sua fé e energia para aceitar o rude golpe. Mas recebeu muitas graças nessa época, o que a levou a afirmar mais tarde que, não fossem os filhos tão pequenos, teria tudo abandonado para ir terminar seus dias em Jerusalém, consagrada inteiramente a Deus.
Essa alma forte e
generosa foi submetida na viuvez a novas provações! O Barão de Chantal , sogro
de Joana, cujo caráter orgulhoso, vaidoso e extravagante ela conhecia,
sentindo-se muito só em sua velhice, queria que a jovem viúva, com os filhos,
fosse lhe fazer companhia.
No novo domicílio,
cuja desordem era igualmente de seu conhecimento, Joana entregou-se a todas as
obras de apostolado e misericórdia por ela desenvolvidas no anterior. Mas
sentindo a necessidade de encontrar um bom diretor espiritual, pediu
insistentemente a Deus essa graça.
Em 1604, o já
merecidamente célebre Bispo de Genebra, São Francisco de Sales, foi pregar a
quaresma em Dijon, cidade natal de Joana. Esta convenceu o sogro a
trasladarem-se para a casa de seu pai para seguirem os sermões.
O grande pregador, a
quem Deus mostrara em sonhos sua futura penitente, imediatamente a reconheceu,
atenta e recolhida, em meio aos fiéis. Esta também reconheceu com emoção aquele
que Deus designara para seu pai espiritual. Começou assim um dos mais belos
parentescos espirituais da História da Igreja, que tantos e tão belos frutos
produziria.
São Francisco de
Sales traçou-lhe uma minuciosa regra de vida. Sob sua direção, Santa Joana de
Chantal progrediu tão rapidamente, que o santo se admirava, dando graças a Deus.
Aos poucos maturava
na mente do Bispo de Genebra o projeto de uma nova congregação religiosa, com
regras adaptadas a virgens e viúvas que, desejando servir a Deus, não se sentiam
atraídas pelas grandes austeridades das famílias religiosas já existentes.
Teriam como oração em comum somente o Ofício Parvo de Nossa Senhora; deveriam
dedicar-se também à assistência dos pobres e enfermos.
Joana pôs-se à sua
disposição para a realização da obra assim que seus filhos estivessem
encaminhados. A mão de Deus fez-se então sentir para abreviar o tempo de espera.
A Baronesa de Chantal tornara-se amicíssima da Baronesa de Boissy, mãe de São
Francisco de Sales, senhora virtuosíssima, viúva e mãe de 13 filhos. Tal era a
confiança que esta tinha em Joana que, a conselho de São Francisco, confiou à
jovem viúva a educação de sua caçula, de nove anos. Esta veio a falecer poucos
anos depois nos braços de Santa Joana.
Para unir por laços
mais fortes que os da amizade as duas famílias, a Senhora de Boissy propôs o
casamento de seu filho, Barão de Thorens, de 14 anos, com Maria Amada, filha
mais velha de Santa Joana, então com 12. O casamento foi oficiado por São
Francisco de Sales e como era costume na época, a jovem esposa foi viver com a
família do marido até atingir a idade núbil.
Santa Joana confiou o
filho, Celso Benigno, ao avô, Presidente Fremyot, que com a ajuda de um
virtuoso preceptor completaria a educação do adolescente. Levando as duas filhas
para terminar sua educação no convento, a Baronesa de Chantal ficava assim livre
para a realização da grande obra.
Antes de partir,
renunciou a todos seus bens em favor dos filhos e embarcou para Annecy, que
fazia parte então do Ducado da Sabóia. Pouco depois, Deus chamou a Si a filha
caçula de Joana, aquela a quem ela mais amava por sua inocência e docilidade.
Em Annecy já a
esperavam três donzelas virtuosas, dirigidas de São Francisco de Sales, que com
ela principiariam a obra. A Congregação idealizada pelo Bispo de Genebra era uma
inovação. Até então só havia conventos de reclusas. Na recém-fundada Congregação
– denominada da Visitação – as religiosas não guardariam clausura, pois deveriam
cuidar dos pobres, o que suscitou muitas controvérsias.
Apesar da pobreza e
das críticas recebidas, novas postulantes foram ingressando na Congregação e
três jovens viúvas de Lyon pediram licença para lá fundar uma casa. Nessa
ocasião, interveio o Cardeal Arcebispo local, convencendo São Francisco de Sales
a erigir e transformar a Congregação em Ordem religiosa e aceitar a obrigação da
clausura perpétua. O Fundador, tendo aceito a proposta, estipulou contudo que
em seus conventos se pudessem receber senhoras e donzelas que quisessem
retirar-se temporariamente para pôr em ordem sua consciência.
Embora muito atenuada
em relação às regras existentes, no que se refere a penitências, jejuns e longos
ofícios em comum, São Francisco de Sales reforçou a pobreza e a obediência da
nova instituição. Nenhuma religiosa poderia ter nada seu, nem mesmo o hábito ou
o rosário que usava. Cada ano havia uma rotação de tudo, inclusive livros e
objetos de piedade.
A finalidade visada
por São Francisco de Sales para sua Congregação seria levada avante pouco depois
por seu grande amigo, São Vicente de Paulo, mediante a criação das Filhas da
Caridade.
Foi cedendo a
instâncias da Madre Chantal e dedicando-o a suas filhas da Visitação, que São
Francisco de Sales escreveu seu famoso Tratado do Amor de Deus. "Minha filha,
disse-lhe o santo Bispo, o Tratado do Amor de Deus está escrito para vós". No
prefácio da obra, ele diz: "Como Deus sabe o muito que estimo essa alma, não foi
pouco o que ela influiu nesta ocasião ... o que mais me moveu a levar avante meu
projeto foram as reiteradas instâncias desta alma".
Àqueles a quem ama,
Nosso Senhor presenteia com sua Cruz. Como alma eleita e muito sensível ao
afeto, a Providência foi tirando de Santa Joana suas mais caras afeições para
que se desapegasse inteiramente das criaturas.
Às provações já
sofridas no transcurso da vida, somaram-se as espirituais, como tentações
terríveis, algumas vezes contra a fé. Conheceu a noite escura e a secura
espiritual para chegar a um grau sublime de contemplação. São Vicente de Paulo
afirmou que, embora aparentando paz e tranqüilidade, Santa Joana "sofria
terríveis provas interiores. Via-se tão assediada de tentações abomináveis, que
tinha que apartar os olhos de si mesma com horror para não contemplar esse
espetáculo insuportável .... Em meio a tão grandes sofrimentos, jamais perdeu a
serenidade nem esmoreceu na plena fidelidade que Deus lhe exigia. Por isso a
considero como uma das almas mais santas que encontrei sobre a terra".
Após a morte de São
Francisco de Sales, não só consolidou a obra nascente, mas a fez expandir.
Durante sua vida, os mosteiros da Visitação elevaram-se a 65. A todos visitou
para satisfazer o desejo que muitas de suas filhas espirituais tinham de
conhecê-la.
Em 1641, a rainha Ana
d’Áustria convidou-a para ir a Paris, cumulando-a de honras e distinções. Era a
exaltação que a Realeza prestava à Santa que foi, em vida, comparável à própria
Mulher forte do Antigo Testamento. Meses depois, foi ela receber, no Céu, a
recompensa demasiadamente grande que Deus reserva a seus eleitos.
Entregou sua alma a
Deus em Moulins, a 13 de dezembro de 1641. Foi beatificada por Bento XIV a 13 de
novembro de 1751 e canonizada por Clemente XIII em 16 julho de 1767.
Fonte: Página do Oriente
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