DOMINGO DE RAMOS - INÍCIO DA GRANDE SEMANA SANTA (SEGUNDO DOMINGO DA PAIXÃO)
Elias, O Profeta
A liturgia de hoje exprime por meio de suas cerimônias, uma impregnada alegria, outra de tristeza, o duplo aspecto sob que podemos considerar a Cruz. Em primeiro lugar, a benção e a procissão de Ramos. Aqui tudo respira a alegria radiosa e deslumbrada que nos permite reviver há quase vinte séculos de distância a cena grandiosa da entrada triunfal do Salvador
Em Jerusalém, no século IV, lia-se neste Domingo, e lugar do
acontecimento a perícopa do Evangelho que refere a entrada apoteótica do
Salvador na cidade santa, aclamado pelas turbas como Rei de Israel. Depois o
bispo montado num Jumento, ia no monte das Oliveiras na Igreja da Ressurreição,
acompanhado do povo, com palmas nas mãos, ao canto de hinos e antífonas. A
Igreja de Roma adotou este costume somente no século IX e ajuntou-lhe a benção
dos Ramos. Na procissão dos Ramos, o povo cristão, na plenitude da sua fé,
repete os gestos dos judeus, dando-lhe todo o seu significado. Como o povo de
Jerusalém aclama a Cristo como triunfador: "Hosana ao filho de David!
Bendito o que vem em nome do Senhor!" Mas, conhecedores pela fé, da sequencia e do significado dos acontecimentos, sabemos o que é e o que
representa esse triunfo. Jesus é o Messias, Filho de David e o Filho de Deus.
Sinal de contradição, é aclamado por uns, detestado por outros. Enviado ao
mundo para nos libertar das garras do pecado e do poder de Satanás, sujeita-se
a paixão, castigo dos nossos pecados, mas sai triunfante do sepulcro, vencedor
da morte; restitui-nos a paz de Deus e introduz-nos consigo no reino do Pai
celeste.
Depois da benção dos ramos, que se efetuava
Explicação da Paixão:
Getsémani
Depois de celebrada a ceia com seus discípulos, Jesus saiu
com eles da cidade pela porta do lado da piscina de Siloé, subiu a vale do Cedrão,
ao longo do bairro de Ofel, e encaminhou-se para o Getsémani, no sopé do monte
das Oliveiras. Os três Apóstolos que foram testemunhas de sua Transfiguração
assistem agora a sua agonia, por três vezes renovada. Judas que vendera o
Mestre, sai da cidade à frente da corte e dos guardas do templo enviados pelo
Sinédrio para prender Jesus. Prendem o Senhor e voltam a Jerusalém pela vereda
do Nordeste, dirigindo-se para a casa do Sumo-Sacerdote.
Diante de
Anás e Caifás
O Sinédrio compunha-se de setenta membros presididos pelos
príncipes dos sacerdotes e superiormente pelo Sumo-Sacerdote, que era naquele
ano Caifás, genro de Anás, o qual obtivera sucessivamente para os filhos e para
o genro o Supremo Pontificado. Infiéis a sua missão, os representantes oficiais
da religião de Israel esperavam um messias guerreiro que os livrassem do julgo
dos Romanos. Jesus foi primeiro conduzido a presença de Anás, que não sendo
sacerdote era incompetente para julgar o Senhor. O processo começava irregular
logo de princípio. Noutra parte deste mesmo edifício esperava Caifás, de pernas
cruzadas, segundo o uso, num estado um pouco elevado, tendo em torno de si toda
a classe sacerdotal sentada em coxins dispostos para o efeito. O Senhor foi
conduzido a sua presença e o julgamento prosseguiu ilegalmente, pois deveria
ser feito durante o dia e eram cerca de duas horas da madrugada. O depoimento
feito pelas supostas testemunhas era insuficiente e contraditório. Então
Caifás, encolerizado, esconjura insolentemente o Senhor (infringindo a lei
mosaica que neste caso anula a confissão do acusado) a que lhe diga se é
realmente o filho de Deus. E Jesus, que esperava aquele momento para falar,
declara oficialmente a sua divindade, na presença da autoridade religiosa
reunida no conselho. O Sumo-Sacerdote rasga então as veste e o Sinédrio o
declara réu de blasfêmia e merecedor de morte. O Senhor aceita a sentença, pois
é precisamente como filho de Deus que há de oferecer ao Pai, pelos homens, um
sacrifício de valor infinito.
Negação de
Pedro. Desespero de Judas
Entregaram-no então, durante o resto da noite, à zombaria
dos criados, que o cobriram de injúrias, cuspindo-lhe no rosto. Pedro, que João
introduzira no pátio do palácio do Sumo Sacerdote, negou por três vezes o
mestre. Depois de o galo cantar a segunda vez, saiu para fora e chorou
amargamente. "Chorou alto", como diz o texto grego. De manhã, o
Sinédrio tornou a reunir-se para dar a sentença, proferida ilegalmente durante
a noite, para dar aparência de legalidade. O Senhor compareceu e foi novamente
condenado. Judas então compreendeu o tamanho de seu crime. Roído de remorso,
vai ter com o Sinédrio ainda reunido e confessa que pecou ao entregar um sangue
justo. Desesperado e perseguido pelos fantasmas da sua própria desgraça, arremessa
ao chão, dentro do templo, o dinheiro que recebera, vai a piscina de Siloé,
mete-se pela garganta do Hinom até um lugar chamado Geena e enforca-se,
partindo o laço e desfazendo-se nas pontas dos rochedos.
Diante de
Pilatos
Só a autoridade romana, de que dependia então a Palestina,
tinha direitos de vida e de morte. Era, pois, necessário remeter o processo ao
procurador romano. Conduziram, portanto, o Senhor ao pretório de Pilatos, que
ficava na torre Antônia. Os judeus não entraram por que tinham por pecado
entrar na casa de um pagão às vésperas da Páscoa. Ia se instaurar-se o processo
civil, mas era necessário um crime de caráter político. Os judeus saberão
inventá-lo. O Messias para os judeus, devia ser, como já vimos, um monarca
terrestre, um rei glorioso e conquistador. Ora Jesus dize-se messias. Nada mais
fácil, portanto, que citá-lo perante Pilatos como amotinador do povo,
concorrente de César no direito ao mandato supremo. No decorrer deste processo,
Jesus manteve a mesma atitude da noite anterior; o mesmo silêncio perante as
acusações, a mesma afirmação peremptória da sua realeza e finalmente o mesmo
tratamento desumano por parte dos soldados de César. Jesus que tudo via e
conduzia e só queria ser condenado como filho de Deus e Rei das almas, colocou
a questão nitidamente no terreno religioso: "o meu reino não é deste
mundo". Pilatos reconheceu que Jesus estava inteiramente inocente. Mas os
judeus não se deixaram vencer e recorreram as ameaças. Pilatos, demasiado fraco
para usar da autoridade diante do povo amotinado, que, sem dúvida, se vingaria
dele acusando-o a César, procurou a força de expedientes contentar o povo e não
ofender os protestos duns restos de consciência pagã e supersticiosa, que o
receio vago dum possível castigo dos deuses tinha despertados.
Jesus enviado
a Herodes. Barrabás
Sabendo Pilatos que Jesus era Galileu, enviou-o a Herodes,
tetrarca da Galileia filho daquele Herodes que ordenou o massacre dos
inocentes, quando os magos lhe anunciaram o nascimento do "Rei dos
Judeus". Humilhado com o silêncio do Senhor, quis humilhar também os
Judeus, vestindo Jesus com um manto branco dos candidatos à realeza, e
remetendo-o novamente a Pilatos. Não surtiu o melhor efeito a escolha entre o homicida
Barrabás e Jesus.
A Flagelação
Era um suplício infamante, reservado aos escravos. O
paciente despojado dos vestidos e atado pelas mãos à argola dum cepo, recebia
os golpes que o executor lhe ia aplicando compassadamente no dorso curvo. Com
os látegos do corpo, rasgava-lhe as espáduas e o peito em sulcos profundos
donde jorrava o sangue e se descolavam pedaços de carne. Neste estado
tristíssimo, mandou Pilatos cobri-lo com um manto escarlate, colocá-lo a coroa
e o cetro e apresentá-lo a multidão. Os judeus compreenderam toda a ironia deste
gesto. Ousariam ver ainda neste homem um competidor de César?
Condenação de
Jesus
Os judeus continuam a insistir, com despeito, no título de
filho de Deus, que será a causa única por que o hão de condenar a morte.
Pilatos, que não resiste ao argumento decisivo com que os judeus o atacam, duma
denúncia a César, recorre ao último expediente e lava as mãos perante o povo,
querendo com isso significar que Jesus é inocente e não o condena senão porque
assim o judeus o exigem em virtude de suas leis. Foi o que afirmou até o fim,
mandando fixar na Cruz a inscrição declaratória do crime e do motivo da
condenação: "Jesus Nazareno, Rei dos Judeus", Pilatos porque era
fraco e covarde, é, sem dúvida, culpado; mas os judeus, levando só por ódio o
Pretor a condená-lo a morte, cometeram um deicídio.
A Caminho do
Calvário. Crucifixão
Cerca das onze horas, O Senhor deixou o Pretório e
encaminhou-se para o Calvário, pelo caminho que desce para o Vale Tirofeon, e
volta depois para leste pela escarpa que dá para as portas da cidade. Era ali,
fora dos muros, o Gólgota ou lugar da execuções. Cerca do meio-dia, o Sol
escureceu-se, fenômeno constatado em toda a extensão do Império, é no meio
desta noite tenebrosa que o Senhor dá seu último suspiro. A cruz era o mais
cruel e atroz dos suplícios: porque a vítima, completamente imobilizada, devia
suportar durante várias horas todo peso do corpo nos braços estendidos. A
tensão terrível questiona o sangue, fazendo afluir a face e o peito e
provocando uma sede ardentíssima. Morrer crucificado é morrer de pura dor, na
mais atroz das agonias. Quando a noite suspendia o supliciado ainda vivo, para
lhe apressar a morte, quebravam-lhe as pernas, que, de ordinário, estavam a um
metro do solo.
Morte e
Sepultura
Está para chegar o momento decisivo que marcará para o
gênero humano a hora do resgate. Para mostrar que não é constrangido, mas é por
amor do Pai e dos homens que aceita a morte, Jesus dá um grande grito e
suspira. Morrer o Salvador. Com Maria, sua Mãe, e São João, fiquemos de pé
junto da Cruz; e com os judeus, que então se converteram, batamos no peito,
porque foi para expiar nossos pecados que ele morreu. Eram três horas da tarde. Às cinco, o Senhor foi retirado da
Cruz e colocado às pressas no sepulcro, porque as seis começava o Sábado, que
naquele ano era muito solene. Coincidia com o 14 de Nisan, o dia mais
importante das festas da Páscoa e que representava à maravilha o repouso eterno
em que o Senhor entrava. Os judeus não tinham cemitérios. Sepultavam os seus
geralmente em sepulcros privativos de famílias, cavados numa propriedade, ou
então à beira das grandes vias de comunicação. Jesus foi deposto no sepulcro
que José de Arimateia possuía numa propriedade junto do Calvário. Repitamos amorosamente, com o Senhor, a oração da comunhão:
"Pai se este cálice não pode passar sem que eu beba, faça-se a vossa
vontade!"
Hosanna Filio David, Benedictus Qui Venit in Nomine Domini
Antiphona - Hosanna filio David
Continuação do Santo Evangelho de Nosso Senhor Jesus
Cristo segundo São Mateus: Naquele tempo:
Aproximavam-se de Jerusalém. Quando chegaram a Betfagé, perto do monte das Oliveiras, Jesus enviou dois de seus discípulos,
dizendo-lhes: Ide à aldeia que está defronte. Encontrareis logo uma jumenta amarrada e com ela seu jumentinho. Desamarrai-os e trazei-mo.
Se alguém vos disser qualquer coisa, respondei-lhe que o Senhor necessita deles e que ele sem demora os devolverá.
Assim, neste acontecimento, cumpria-se o oráculo do profeta:
Dizei à filha de Sião: Eis que teu rei vem a ti, cheio de doçura, montado numa jumenta, num jumentinho, filho da que leva o jugo (Zc 9,9).
Os discípulos foram e executaram a ordem de Jesus.
Trouxeram a jumenta e o jumentinho, cobriram-nos com seus mantos e fizeram-no montar.
Então a multidão estendia os mantos pelo caminho, cortava ramos de árvores e espalhava-os pela estrada.
E toda aquela multidão, que o precedia e que o seguia, clamava: Hosana ao filho de Davi! Bendito seja aquele que vem em nome do Senhor! Hosana no mais alto dos céus!
Aproximavam-se de Jerusalém. Quando chegaram a Betfagé, perto do monte das Oliveiras, Jesus enviou dois de seus discípulos,
dizendo-lhes: Ide à aldeia que está defronte. Encontrareis logo uma jumenta amarrada e com ela seu jumentinho. Desamarrai-os e trazei-mo.
Se alguém vos disser qualquer coisa, respondei-lhe que o Senhor necessita deles e que ele sem demora os devolverá.
Assim, neste acontecimento, cumpria-se o oráculo do profeta:
Dizei à filha de Sião: Eis que teu rei vem a ti, cheio de doçura, montado numa jumenta, num jumentinho, filho da que leva o jugo (Zc 9,9).
Os discípulos foram e executaram a ordem de Jesus.
Trouxeram a jumenta e o jumentinho, cobriram-nos com seus mantos e fizeram-no montar.
Então a multidão estendia os mantos pelo caminho, cortava ramos de árvores e espalhava-os pela estrada.
E toda aquela multidão, que o precedia e que o seguia, clamava: Hosana ao filho de Davi! Bendito seja aquele que vem em nome do Senhor! Hosana no mais alto dos céus!
"Pueri Hebraeorum portantes ramos olivarum, obviaverunt Domino, clamantes et dicentes: Hosanna in excelsis"
Gloria laus et honor tibi sit, Rex Christe, Redemptor: Cui puerile decus prompsit Hosanna pium.
Epístola
Leitura da Epístola de São Paulo Apóstolo aos Filipenses (2,5-11) . Irmãos: Dedicai-vos mutuamente a estima que se deve em Cristo Jesus. Sendo ele de condição divina, não se prevaleceu de sua igualdade com Deus, mas aniquilou-se a si mesmo, assumindo a condição de escravo e assemelhando-se aos homens. E, sendo exteriormente reconhecido como homem, humilhou-se ainda mais, tornando-se obediente até a morte, e morte de cruz. Por isso Deus o exaltou soberanamente e lhe outorgou o nome que está acima de todos os nomes, para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho no céu, na terra e nos infernos. E toda língua confesse, para a glória de Deus Pai, que Jesus Cristo é Senhor.
LEITURA DA PAIXÃO DE NOSSO SENHOR JESUS CRISTO
Retirou-se Jesus com eles para um lugar chamado Getsêmani e disse-lhes:
Assentai-vos aqui, enquanto eu vou ali orar. E, tomando consigo Pedro e os dois
filhos de Zebedeu, começou a entristecer-se e a angustiar-se. Disse-lhes,
então: Minha alma está triste até a morte. Ficai aqui e vigiai comigo. Adiantou-se
um pouco e, prostrando-se com a face por terra, assim rezou: Meu Pai, se é
possível, afasta de mim este cálice! Todavia não se faça o que eu quero, mas
sim o que tu queres. Foi ter então com os discípulos e os encontrou dormindo. E
disse a Pedro: Então não pudestes vigiar uma hora comigo... Vigiai e orai para
que não entreis em
tentação. O espírito está pronto, mas a carne é fraca.
Afastou-se pela segunda vez e orou, dizendo: Meu Pai, se não é possível que
este cálice passe sem que eu o beba, faça-se a tua vontade! Voltou ainda e os
encontrou novamente dormindo, porque seus olhos estavam pesados. Deixou-os e
foi orar pela terceira vez, dizendo as mesmas palavras. Voltou então para os
seus discípulos e disse-lhes: Dormi agora e repousai! Chegou a hora: o Filho do
Homem vai ser entregue nas mãos dos pecadores... Levantai-vos, vamos! Aquele
que me trai está perto daqui. Jesus ainda falava, quando veio Judas, um dos
Doze, e com ele uma multidão de gente armada de espadas e cacetes, enviada
pelos príncipes dos sacerdotes e pelos anciãos do povo. O traidor combinara com
eles este sinal: Aquele que eu beijar, é ele. Prendei-o! Aproximou-se
imediatamente de Jesus e disse: Salve, Mestre. E beijou-o. Disse-lhe Jesus: É,
então, para isso que vens aqui? Em seguida, adiantaram-se eles e lançaram mão
em Jesus para prendê-lo. Mas um dos companheiros de Jesus desembainhou a espada
e feriu um servo do sumo sacerdote, decepando-lhe a orelha. Jesus, no entanto,
lhe disse: Embainha tua espada, porque todos aqueles que usarem da espada, pela
espada morrerão. Crês tu que não posso invocar meu Pai e ele não me enviaria
imediatamente mais de doze legiões de anjos? Mas como se cumpririam então as
Escrituras, segundo as quais é preciso que seja assim? Depois, voltando-se para
a turba, falou: Saístes armados de espadas e porretes para prender-me, como se
eu fosse um malfeitor. Entretanto, todos os dias estava eu sentado entre vós
ensinando no templo e não me prendestes. Mas tudo isto aconteceu porque era
necessário que se cumprissem os oráculos dos profetas. Então os discípulos o
abandonaram e fugiram. Os que haviam prendido Jesus levaram-no à casa do sumo
sacerdote Caifás, onde estavam reunidos os escribas e os anciãos do povo. Pedro
seguia-o de longe, até o pátio do sumo sacerdote. Entrou e sentou-se junto aos
criados para ver como terminaria aquilo. Enquanto isso, os príncipes dos
sacerdotes e todo o conselho procuravam um falso testemunho contra Jesus, a fim
de o levarem à morte. Mas não o conseguiram, embora se apresentassem muitas falsas
testemunhas. Por fim, apresentaram-se duas testemunhas, que disseram: Este
homem disse: Posso destruir o templo de Deus e reedificá-lo em três dias.
Levantou-se o sumo sacerdote e lhe perguntou: Nada tens a responder ao que essa
gente depõe contra ti? Jesus, no entanto, permanecia calado. Disse-lhe o sumo
sacerdote: Por Deus vivo, conjuro-te que nos digas se és o Cristo, o Filho de
Deus? Jesus respondeu: Sim. Além disso, eu vos declaro que vereis doravante o
Filho do Homem sentar-se à direita do Todo-poderoso, e voltar sobre as nuvens
do céu. A estas palavras, o sumo sacerdote rasgou suas vestes, exclamando: Que
necessidade temos ainda de testemunhas? Acabastes de ouvir a blasfêmia! Qual o
vosso parecer? Eles responderam: Merece a morte! Cuspiram-lhe então na face,
bateram-lhe com os punhos e deram-lhe tapas, dizendo: Adivinha, ó Cristo: quem
te bateu? Enquanto isso, Pedro estava sentado no pátio. Aproximou-se dele uma
das servas, dizendo: Também tu estavas com Jesus, o Galileu. Mas ele negou
publicamente, nestes termos: Não sei o que dizes. Dirigia-se ele para a porta,
a fim de sair, quando outra criada o viu e disse aos que lá estavam: Este homem
também estava com Jesus de Nazaré. Pedro, pela segunda vez, negou com
juramento: Eu nem conheço tal homem. Pouco depois, os que ali estavam
aproximaram-se de Pedro e disseram: Sim, tu és daqueles; teu modo de falar te
dá a conhecer. Pedro então começou a fazer imprecações, jurando que nem sequer
conhecia tal homem. E, neste momento, cantou o galo. Pedro recordou-se do que
Jesus lhe dissera: Antes que o galo cante, negar-me-ás três vezes. E saindo,
chorou amargamente. Chegando a manhã, todos os príncipes dos sacerdotes e os
anciãos do povo reuniram-se em conselho para entregar Jesus à morte. Ligaram-no
e o levaram ao governador Pilatos. Judas, o traidor, vendo-o então condenado,
tomado de remorsos, foi devolver aos príncipes dos sacerdotes e aos anciãos as
trinta moedas de prata, dizendo-lhes: Pequei, entregando o sangue de um justo.
Responderam-lhe: Que nos importa? Isto é lá contigo! Ele jogou então no templo
as moedas de prata, saiu e foi enforcar-se. Os príncipes dos sacerdotes tomaram
o dinheiro e disseram: Não é permitido lançá-lo no tesouro sagrado, porque se
trata de preço de sangue. Depois de haverem deliberado, compraram com aquela
soma o campo do Oleiro, para que ali se fizesse um cemitério de estrangeiros.
Esta é a razão por que aquele terreno é chamado, ainda hoje, Campo de Sangue.
Assim se cumpriu a profecia do profeta Jeremias: Eles receberam trinta moedas
de prata, preço daquele cujo valor foi estimado pelos filhos de Israel; e
deram-no pelo campo do Oleiro, como o Senhor me havia prescrito. Jesus
compareceu diante do governador, que o interrogou: És o rei dos judeus? Sim,
respondeu-lhe Jesus. Ele, porém, nada respondia às acusações dos príncipes dos
sacerdotes e dos anciãos. Perguntou-lhe Pilatos: Não ouves todos os testemunhos
que levantam contra ti? Mas, para grande admiração do governador, não quis
responder a nenhuma acusação. Era costume que o governador soltasse um preso a
pedido do povo em cada festa de Páscoa. Ora, havia naquela ocasião um
prisioneiro famoso, chamado Barrabás. Pilatos dirigiu-se ao povo reunido: Qual
quereis que eu vos solte: Barrabás ou Jesus, que se chama Cristo? (Ele sabia que
tinham entregue Jesus por inveja.) Enquanto estava sentado no tribunal, sua
mulher lhe mandou dizer: Nada faças a esse justo. Fui hoje atormentada por um
sonho que lhe diz respeito. Mas os príncipes dos sacerdotes e os anciãos
persuadiram o povo que pedisse a libertação de Barrabás e fizesse morrer Jesus.
O governador tomou então a palavra: Qual dos dois quereis que eu vos solte?
Responderam: Barrabás! Pilatos perguntou: Que farei então de Jesus, que é
chamado o Cristo? Todos responderam: Seja crucificado! O governador tornou a
perguntar: Mas que mal fez ele? E gritavam ainda mais forte: Seja crucificado!
Pilatos viu que nada adiantava, mas que, ao contrário, o tumulto crescia. Fez
com que lhe trouxessem água, lavou as mãos diante do povo e disse: Sou inocente
do sangue deste homem. Isto é lá convosco! E todo o povo respondeu: Caia sobre
nós o seu sangue e sobre nossos filhos! Libertou então Barrabás, mandou açoitar
Jesus e lho entregou para ser crucificado. Os soldados do governador conduziram
Jesus para o pretório e rodearam-no com todo o pelotão. Arrancaram-lhe as
vestes e colocaram-lhe um manto escarlate. Depois, trançaram uma coroa de
espinhos, meteram-lha na cabeça e puseram-lhe na mão uma vara. Dobrando os
joelhos diante dele, diziam com escárnio: Salve, rei dos judeus! Cuspiam-lhe no
rosto e, tomando da vara, davam-lhe golpes na cabeça. Depois de escarnecerem
dele, tiraram-lhe o manto e entregaram-lhe as vestes. Em seguida, levaram-no
para o crucificar. Saindo, encontraram um homem de Cirene, chamado Simão, a
quem obrigaram a levar a cruz de Jesus. Chegaram ao lugar chamado Gólgota, isto
é, lugar do crânio. Deram-lhe de beber vinho misturado com fel. Ele provou, mas
se recusou a beber. Depois de o haverem crucificado, dividiram suas vestes
entre si, tirando a sorte. Cumpriu-se assim a profecia do profeta: Repartiram
entre si minhas vestes e sobre meu manto lançaram a sorte (Sl 21,19).
Sentaram-se e montaram guarda. Por cima de sua cabeça penduraram um escrito
trazendo o motivo de sua crucificação: Este é Jesus, o rei dos judeus. Ao mesmo
tempo foram crucificados com ele dois ladrões, um à sua direita e outro à sua
esquerda. Os que passavam o injuriavam, sacudiam a cabeça e diziam: Tu, que
destróis o templo e o reconstróis em três dias, salva-te a ti mesmo! Se és o
Filho de Deus, desce da cruz! Os príncipes dos sacerdotes, os escribas e os
anciãos também zombavam dele: Ele salvou a outros e não pode salvar-se a si
mesmo! Se é rei de Israel, desça agora da cruz e nós creremos nele! Confiou em
Deus, Deus o livre agora, se o ama, porque ele disse: Eu sou o Filho de Deus! E
os ladrões, crucificados com ele, também o ultrajavam. Desde a hora sexta até a
nona, cobriu-se toda a terra de trevas. Próximo da hora nona, Jesus exclamou em
voz forte: Eli, Eli, lammá sabactáni? - o que quer dizer: Meu Deus, meu Deus,
por que me abandonaste? A estas palavras, alguns dos que lá estavam diziam: Ele
chama por Elias. Imediatamente um deles tomou uma esponja, embebeu-a em vinagre
e apresentou-lha na ponta de uma vara para que bebesse. Os outros diziam:
Deixa! Vejamos se Elias virá socorrê-lo. Jesus de novo lançou um grande brado,
e entregou a alma. E eis que o véu do templo se rasgou em duas partes de alto a
baixo, a terra tremeu, fenderam-se as rochas. Os sepulcros se abriram e os
corpos de muitos justos ressuscitaram. Saindo de suas sepulturas, entraram na
Cidade Santa depois da ressurreição de Jesus e apareceram a muitas pessoas. O
centurião e seus homens que montavam guarda a Jesus, diante do estremecimento
da terra e de tudo o que se passava, disseram entre si, possuídos de grande
temor: Verdadeiramente, este homem era Filho de Deus! Havia ali também algumas
mulheres que de longe olhavam; tinham seguido Jesus desde a Galiléia para o
servir. Entre elas se achavam Maria Madalena e Maria, mãe de Tiago e de José, e
a mãe dos filhos de Zebedeu. À tardinha, um homem rico de Arimatéia, chamado
José, que era também discípulo de Jesus, foi procurar Pilatos e pediu-lhe o
corpo de Jesus. Pilatos cedeu-o. José tomou o corpo, envolveu-o num lençol
branco e o depositou num sepulcro novo, que tinha mandado talhar para si na
rocha. Depois rolou uma grande pedra à entrada do sepulcro e foi-se embora.
Lefebvre, Dom Gaspar. Missal Quotidiano e
Vesperal. Bruges, Bélgica; Abadia de S. André, 1960.
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