Teologia Ascética e Mística: Da Parte da Santíssima Virgem, dos santos e dos anjos na vida cristã (Parte V)
Conclusão: Devoção à Ss. Virgem
Desempenhando Maria papel tão importante em nossa vida
espiritual, devemos ter para com ela grandíssima devoção. Esta palavra quer
dizer dedicação, e dedicação quer dizer, dom em si mesmo. Seremos, pois,
devotos de Maria, se nos dermos completamente a ela, e por ela, a Deus. Nisto
não faremos senão imitar o próprio Deus que se nos dá a nós e nos dá também o
Filho por intermédio de Maria. Daremos a nossa inteligência pela veneração mais
profunda, a nossa vontade pela nossa
confiança mais absoluta, o nosso coração pelo amor mais filial, inteiramente
todo o nosso ser pela imitação mais perfeita, que for possível das suas
virtudes.
Veneração mais profunda: Esta veneração se baseia na
dignidade de Mãe de Deus e nas consequências que daí dimanam. E, com efeito, jamais
nos será possível estimar demasiadamente aquela que o Verbo Encarnado venera
como sua Mãe, que o Pai contempla com amor como sua filha muito amada e que o
Espírito Santo considera como seu templo e predileção. O Pai trata-a com o maior respeito, enviando-lhe
um anjo que a saúda como cheia de graça e pede seu consentimento na obra da
Encarnação, à qual que tão intimamente associar: O Filho respeita-a, ama-a como
sua Mãe e obedece-lhe; o Espírito Santo vem até ela e nela tem as suas
complacências. Venerando Maria não fazemos, pois, senão associar-nos as três
pessoas divinas Pessoas e estimar o que Eles estimam.
Há sem dúvida excessos que é mister evitar, particularmente
tudo aquilo que porventura tendesse colocá-la a par de Deus, ou fazer dela a
fonte da graça. Mas, enquanto a consideramos como criatura, que não tem
grandeza, nem santidade, nem poder senão na medida em que Deus lhe confere, não
há excesso que recear: é Deus que veneramos nela.
Esta veneração deve ser maior que a que temos para com os
Anjos e os Santos, precisamente porque ela, pela sua dignidade de Mãe de Deus,
pelo múnus de Mediadora, pela sua santidade sobrepuja todas as criaturas. E
assim o seu culto, não obstante de ser dulia e não de latria é chamado com
razão de hiperdulia, pois é superior ao que se tributa aos Anjos e aos Santos.
Confiança Absoluta: fundada no poder e na bondade de Maria:
a) este poder vem não dela mesma, mas do seu poder de
intercessão, já que Deus não quer recusar nada de legítimo àquela que ama e
venera acima de todas as criaturas. Nada mais equitativo: tendo Maria
subministrado a Jesus aquela humanidade que lhe permitiu merecer, tendo
colaborado com Ele pelas suas ações e sofrimentos na obra redentora, é
conveniente que tenha parte na distribuição dos frutos das Redenção: Jesus não
recusará pois, nada que ela pedir de legítimo, e assim poderá se dizer que ela
é onipotente pelas suas súplicas, omnipotentia supplex;
b) Quanto a sua bondade, essa é a de Mãe que
transfere para nós, membros de Jesus Cristo, a afeição que tem para com seu
Filho; de Mãe que, tendo nos dado a luz na dor, entre as angústias do Calvário,
nos terá tanto maior amor quanto mais lhe custarmos. Por conseguinte a nossa
confiança para com ela será inabalável e universal.
Inabalável, a despeito das nossas misérias e faltas. É que,
na verdade, Maria é Mãe de Misericórdia, Mater
Misericordiae, que não tem que se ocupar da justiça, mas foi escolhida para
exercer antes de tudo a compaixão, a
bondade, a condescendência: sabendo que nos achamos expostos aos ataques da
concupiscência, do mundo e do demônio, tem compaixão de nós, que não cessamos
de ser seus filhos, ainda quando caímos em pecado. E assim, tanto que
manifestamos o mínimo sinal de boa vontade, o desejo de voltar a Deus. Ela nos
acolhe com bondade; muitas vezes até, é Ela que, antecipando-se, a esses bons
movimentos, nos alcançará as graças que os excitarão em nossas almas. A Igreja
compreendeu-o tão bem que instituiu, para certas dioceses, uma festa sob esta
invocação que, à primeira vista parece estranha, , mas na realidade, é
perfeitamente justificada, de Coração Imaculado de Maria, refúgio dos
pecadores; precisamente porque é imaculada e jamais cometeu a menor falta, é
que Maria tem maior compaixão dos seus pobres filhos que não gozam, com ela, do
privilégio da isenção da concupiscência.
Universal, isto é, deve estender-se a todas as graças de que
precisamos, graças de conversão, de progresso espiritual, de perseverança
final, graças de preservação no meio dos perigos, nas angústias, das
dificuldades mais graves que se podem apresentar. É esta confiança que
recomenda tão instantemente São Bernardo: “Se levantam as tempestades das
tentações, se vos encontrais no meio dos escolhos das tribulações, erguei os
olhos para a estrela do mar, chamai a Maria em vosso auxílio; se sois sacudidos
à mercê das vagas da soberba, da ambição, da maledicência, da inveja, olhai
para a estrela, invocai a Maria. Se a cólera, a avareza, os prazeres da carne
agitam a barca de vossas almas, ponde os olhos em Maria. Se, perturbados pela
grandeza dos vossos crimes, confusos pelo estado miserável da vossa consciência,
transidos de horror com o pensamente do juízo, começais a assombrar no abismo
da tristeza e do desespero, pensai em Maria. No meio dos perigos, das angústias,
das incertezas, pensai em Maria, invoca a Maria. A sua invocação, o pensamento
dela não se afaste nem do vosso coração, nem dos vossos lábios; e para,
obterdes mais seguramente o auxílio das suas preces, não vos descuideis de imitar
os seus exemplos. Seguindo-a, não vos extraviais; suplicando-a, não
desesperais; pensando nela, não vos perdeis. Enquanto ela vos tem de sua mão,
não podeis cair; sob a sua proteção, não tendes nada que temer; sob a sua guia,
não há cansaço; com o seu favor, chega-se seguramente ao termo” (Homi.II, De laudibus Virg. Matris 17).
E, como temos constantemente necessidade de graça, para vencer os inimigos e
progredir na virtude, devemos dirigir-nos muito amiúde àquela que tão
justamente é chamada de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro.
(Fonte: Compêndio de Teologia e Ascética e Mística - AD. Tanquerey - 1961)
(Fonte: Compêndio de Teologia e Ascética e Mística - AD. Tanquerey - 1961)
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